sábado, 24 de julho de 2010

Da vida e da morte

Da vida e da morte
Não estamos preparados para a morte. Foi essa a constatação que tive ao conversar com uma colega de faculdade que não via fazia anos. E foi ali, no meio do shopping e do barulho da praça de alimentação que ela me contou que havia perdido um filho. Às vezes, acho que sou uma das poucas pessoas que vêem na morte um acontecimento social. Sim, afora a dor, o sofrimento da família e ter alguém estirado no meio do salão, velório é evento social que como tal exige comportamento e roupa adequada. É um momento onde a família, os amigos e os penetras estão lá para celebrar a vida e se despedir de alguém. Onde experimentamos um turbilhão de emoções comandando nosso comportamento.
Estão lá os familiares conformados ou atônitos e sem chão com o ocorrido, alguns amigos tristes, outros nem tanto e os penetras que querem saber o que aconteceu. Recentemente enterrei duas amigas em menos de um mês, com a primeira, fiquei triste e foi doloroso ver os pais dela já velhinhos sentados ao lado do caixão enterrando mais um filho. Detalhe: minha amiga sofria de uma doença hereditária que já havia levado dois irmãos. Então já viu a comoção. Já a outra não me afetou tanto, durante o funeral encontrei antigos colegas de trabalho e passamos a cerimônia inteira atrás da capela relembrando os velhos tempos e nossos bons momentos juntos.
Isso me lembra uma amiga me contando que tem um primo que ela adora, mas eles só se encontram em casamentos e velórios da família, ela afirma que eles dão boas risadas e aproveitam pra colocar o papo em dia. Fiquei imaginando se eles vão dar boas risadas quando alguém muito querido for o morto da vez.
Com a minha primeira amiga, pude observar como as pessoas estavam chocadas e ouvi muitos comentários do tipo: Não sei como reagiria se minha mãe morresse ou eu enlouqueceria se isso acontecesse comigo. Ora, quando lidamos com a morte a grande questão não é se, mas quando. E mais, não existe curso com o titulo: Como perder sua mãe em 10 lições ou O que devo fazer quando alguém que eu amo morreu? Com 180 horas e certificação no final. Isso nós aprendemos na porrada e na dor.
Morrer faz parte de vida, isso é fato. E por mais antinatural que pareça, filhos morrem antes dos pais, pais morrem quando seus filhos ainda são pequenos e às vezes a morte leva dois ou mais da família de uma só vez. Meu amigo João, enterrou de uma só vez o cunhado e dois sobrinhos, minha mãe tem uma amiga que enterrou o marido e a filha no mesmo dia, e outro amigo que enterrou os pais juntos, vitimas de um acidente de transito. Se faz parte do nosso cotidiano, por que é tão difícil lidar com ela? Porque a morte escapa ao nosso controle, principalmente neste século onde a maioria das doenças são curáveis, somos limpos e asseados e temos acesso a muita informação e mais centenas de ferramentas que prolongam a vida. Nós não queremos a morte faça parte do nosso cotidiano. Percebemos que quanto mais tentamos afastá-la mais difícil fica administrar o luto quando nos deparamos com ela. Não é fugindo dela que nos manteremos a salvo. Sabe aquele ditado se correr o bicho pega... Como tudo na vida a morte tem que ser encarada de frente.
A minha amiga que perdeu o filho me contou todas as suas dificuldades: a revolta, a dor, a tristeza e a força de se levantar todos os dias e continuar vivendo. Claro, que falei de psicólogos, filmes, reforcei que respeitasse o tempo dela. No que ela me devolveu dizendo que tudo que passou e continua passando é encarado de cara limpa, pois ela se recusa a tomar qualquer coisa que aplaque sua dor. Mulher corajosa essa. Mas percebi que a dor não diminuiu ao ponto dela ver graça na vida, ainda. Paciência, o tempo dela vai chegar, eu sinceramente espero.
Recentemente revi Crepúsculo e vi uma frase que ilustra bem isso:... “morrer é fácil, tranqüilo; viver é mais difícil.” Sim, viver é muito mais difícil, continuar a andar sobre a terra, ver o sol nascer e se por, traz a tona uma série de questionamentos: Por que ele? Por que não fui eu? E agora? O que vai ser de mim? Da minha vida? Particularmente acredito que não se vive um dia a mais do que nos é proposto, não interessa se é jovem ou velho. Acreditar que além da nossa vida há algo maior e o mais importante, amar e ser amado, pela família e amigos torna essa experiência cruel, muito mais fácil. Se manter são, sóbrio e corajoso nos torna, mais fortes, mas não imunes.
A morte faz parte da vida, como reagimos a ela é o que nos diferencia e faz a vida valer a pena.
Beijos.

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